Drumming GP, Joana Gama, Luís Fernandes e Pedro Maia na Culturgest (reportagem)

       
      Tempos tormentosos. Muitos leitores que já passaram duras provas, não concebiam possível que a inesperada pandemia global, designada SARS-CoV-2-19, conhecida pela terminologia "coronavírus", se expandisse quase à velocidade da luz, mudando tanto as suas vidas e o mundo nestes últimos meses, constrangindo, desmedidamente, os sistemas nacionais de saúde.

      O Velho Continente passou a ser o ponto central de uma pandemia originada na China. A velocidade com que se transmite, muito superior do que a SARS, ocorrida há dezoito anos num nível inferior de contágio e de óbitos - só era transmitida por enfermos muito débeis, enquanto que este agente infeccioso pode ser difundido por pessoas que tenham poucos ou nenhuns sintomas - mudou o mundo que estávamos habituados a ver mais ou menos estável, suspendendo abruptamente o nosso modus vivendi que era bastante previsível, porquanto sumiram-se muitas das coisas que considerávamos garantidas. Fomos confrontados com o confinamento de cidades e até de países, o encerramento de fronteiras e subsequente interdição de viagens, a escasseza de serviços e a proibição de eventos desportivos e culturais. Tais medidas, resultaram em ruas desertas, estádios, salas de espectáculos e igrejas vazias e o altíssimo teor de risco nos empregos, nos negócios e na segurança económica.

      Para os distribuidores da sétima arte, 2020 é funesto, apresentando quebras na ordem dos 80%. As medidas implementadas que cancelam as sessões das 21h00 e de fim-de-semana, as quais representam cerca de 70% da facturação média, agonizam ainda mais um sector com salas vazias e filmes sem datas para estrear. A gravidade da situação ameaça, igualmente, as salas de espectáculos, com dias de não vender um bilhete. As últimas alterações aos horários de recolhimento foram um golpe muito intenso que provocou mais hemorragia, deixando a cultura em alerta, provocando o cancelamento de espectáculos e outros eventos em estabelecimentos culturais.

      No dia em que foi anunciado que o estado de emergência agravou a crise na cultura, a Culturgest, em Lisboa, prestou um contributo valioso ao acolher, com público, a apresentação ao vivo do álbum «Textures & Lines». Resultante do repto feito por Drumming Grupo de Percussão à dupla Joana Gama (pianista clássica) / Luís Fernandes (artista electrónico de sonoplastia) e Pedro Maia (projectista de imagem em tempo real), este foi o concerto ideal para todos aqueles que desejam fazer uma pausa para analisar, reflectir ou abstrair-se em tempo de crise.

     Sem pausa, tocam o disco na integra. A actuação encetou com a pianista executando um prato com brandura, enquanto que Miguel Bernat, João Dias e João Simões, antes de tocarem com arco as lâminas das marimbas, manipulam as cordas e madeiras do piano com fios e berlindes, gerando tensão sonora expansível à ambiência, suspensa no trabalho electroacústico de Fernandes, inquietando o público menos conhecedor do registo discográfico. Em igual proporção, a emoção, pressão e tensão sonora sofrem metamorfose com a primeira frase da partitura de «Two Poles», como se as vacinas anunciadas colocassem ponto final no Inverno, iniciando a Primavera e criando pela primeira vez uma oportunidade de esperança na sociedade cheia de interrogações e cada vez mais vulnerável pelo vírus.

      Na linha melódica de «Floating», a técnica empregue por Joana ao pressionar a corda da tecla tocada, assemelha-se à sonoridade da harpa. Neste tema, os percussionistas revelam sons semelhantes aos audíveis no ambiente subaquático, nomeadamente das baleias.

      Entre as formas e estilos musicais, a música revelada pelas três entidades, assenta em substantiva composição sonora, gerando arte abstracta. Até serem pendurados, o público não imaginava que a cantoria da chuva fosse emitida por dois pequenos altofalantes, seguindo-se a recriação de névoa no palco.

      Durante uma hora, foi focalizada a exploração do som, sendo patente a fusão entre música e criação gráfica, repleta de movimento e de contrastes apropriada para a época vivida.

      "Uau papá, esta música é relaxante!", disse uma criança em idade pré-escolar no final do concerto. Uma coisa é certa: a música continua imune à pandemia.

Excelente reportagem!

MUITOS PARABÉNS!

Excelente reportagem escrita, "falada" e fotografada

EDIT: Só posso acrescentar que gosto da tua msg (não da minha) através da nova funcionalidade do fórum.

Parabéns pela qualidade da reportagem e um agradecimento porque estas coisas dão trabalho.

Fica a pista para explorar melhor.